Carta à Bahia

Marina Morgan
2 min readJan 12, 2023

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09/01/2023

À Bahia

Tenho achado difícil escrever sobre o nosso encontro. Talvez por ter sido o primeiro, talvez pela intensidade do que aí foi vivido, talvez pelo fôlego que perdi diante da sua beleza estonteante.

Das minas gerais até a sua terra de todos os santos e orixás, eu levava junto comigo meu grande amor, um livro de Jorge Amado, uma penca de amigos e o coração em alvoroço. Foram 37 horas de viagem, mas o cansaço do tempo na estrada foi compensado tão logo meus pés pisaram em suas areias e meus olhos fitaram seu mar tranquilo e repleto de saveiros.

Nos dias em que passamos juntas dividimos um universo: os biquínis acostumados às águas das cachoeiras sendo banhados por ondas salgadas, moquecas de camarão fresco acompanhadas de caipirinhas geladas, a areia quente sob os pés descalços, céus e sóis com as cores do dendê, a música brasileira sendo tocada e ouvida aos quatro ventos — que por sua vez assanhavam nossos cabelos e nossas cangas –, a maresia confundida com o calor, o riso e o pranto, os mistérios das relações, os banhos frios, os acordes de Caymmi num violão que até agora não sei dizer se estava sendo tocado na beira da praia ou no fundo do meu imaginário construído pela arte dos grandes que nasceram por aí.

Como foi feliz o nosso encontro, Bahia! Demorei 32 anos para conhecê-la, para ver de perto aquilo que há muito habitava somente dentro de mim. Vinda de uma terra onde há “noventa por cento de ferro nas calçadas, oitenta por cento de ferro nas almas”, foi um deleite entender como e por quê por aí o tempo passa diferente: o ritmo das águas e a cadência do sotaque deixam tudo mais leve, quase etéreo.

Daquilo que levei comigo tudo trouxe de volta, mas não só. Enquanto me despedia de você e do seu oceano de profundezas pela janela do avião, revisitava na parede da memória as lembranças do céu estrelado de suas noites calmas, dos arrasta-pés na beirada da praia, da esperança que brotou no peito na chegada de um novo ano. Do nosso encontro trouxe para Minas os amigos antigos e muitos outros novos, a pele queimada pelo sol, uma pulseirinha no braço e uma Marina um tanto quanto diferente.

E, mais do que isso, trouxe também uma vontade imensa de voltar.

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